por Leandro Rodolfo Schenk (1) e Luciana Bongiovanni Martins Schenk (2)


Muito tem sido comentado quanto à participação de profissionais do exterior na elaboração de projetos públicos nacionais, se tais desempenhos – ao invés de serem contratados diretamente pelo poder público – não poderiam vir a se tornar motivo para a organização de concursos públicos internacionais de arquitetura, ampliando assim o leque de possibilidades de interação cultural.

Ao mesmo tempo em que se dá essa contratação estrangeira, o arquiteto londrino Patrick Schumacher em recente entrevista conferida à Revista AU, chamou a atenção ao fato de que a cultura arquitetônica brasileira deveria se tornar mais receptiva às influências internacionais: “O Brasil é um país tipicamente isolado nessa questão. Há alguns outros países em que encontramos a mesma coisa. Na Escandinávia os júris em concursos selecionam arquitetos de seu país, eles não querem que outros arquitetos participem. Ainda há algumas ilhas resistentes e antiglobalização. O país está se abrindo e os brasileiros devem também sair para construir, para competir com outros arquitetos, e então poderemos ver se podem competir em concursos internacionais. É muito melhor do que se deitar em um tipo de zona de proteção”. (Pini, AU, dezembro de 2008, seção Cenário, entrevistadora Bianca Antunes, p.14/15).

Muito embora esse discurso possa ser questionado sob vários aspectos, especialmente pelo considerável viés ideológico que carrega – inclusive ao nos rotular certas limitações questionáveis – é preciso extrair da crítica sua dimensão profícua: o regime de confronto e interação proposto numa competição entre arquitetos de diferentes culturas é a realidade dos concursos, nacionais ou internacionais; uma troca ativa, continuada, e (supostamente) multilateral. A diferença é bem vinda porque pode apresentar uma nova perspectiva cujo motor ultrapassa o imediato. Em arquitetura, no projeto da cidade e da paisagem, parece valer a idéia de que não apenas o arquiteto autóctone pode projetar seu lugar.

Esse é o ponto.

Acabamos de ter ciência quanto às restrições criadas nas inscrições para o Concurso Público Praça do Natal, promovido pela Prefeitura Municipal de Natal, através da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos, cuja organização compete ao Departamento do Rio Grande do Norte do Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB/RN.

Ao ler o Edital do Concurso observa-se que a predisposição maior para trocas de informações, em escala nacional, ocorre na composição da banca julgadora, que conta com a presença do arquiteto paulista Marcos Acayaba. Contudo, caso um arquiteto não residente no estado do Rio Grande do Norte queira participar da competição, será preciso cumprir com um pré-requisito, discriminado no edital:

Ítem 3.1.2. É permitida a participação de profissionais residentes em outros estados da federação brasileira, desde que com a indicação de outro profissional, também arquiteto, com endereço profissional no Rio Grande do Norte e registro ou visto no CREA/RN, para representar o Responsável junto ao PROMOTOR e ao ORGANIZADOR.”

Uma ressalva desse teor torna evidente o quanto estamos voltando para trás. Mesmo que o intuito tenha sido o de facilitar o diálogo entre promotores/organizadores e vencedores do concurso, por si a medida termina restringindo a competição ao fazê-la acontecer entre arquitetos do Rio Grande do Norte.

Já não bastava o CREA ser faccionado por Estados, algo que gera vários transtornos burocráticos e sobrecargas tributárias; agora, aquilo que compreendemos ser protecionismo está alcançando o Instituto de Arquitetos do Brasil, uma entidade representativa de nossa classe, concebida para nos promover e nos articular culturalmente.

Esperamos que esse evento isolado, para o concurso específico promovido pelo IAB/RN, não imprima nenhuma tendência para procedimentos futuros. Seria por demais frustrante observar tal retrocesso, ver uma entidade da notoriedade do Instituto de Arquitetos do Brasil, mesmo que parcialmente representada através dos seus departamentos, ingressando nesse tipo de regime excludente.

________________________________________________________________________

(1)Leandro Rodolfo Schenk, arquiteto urbanista (FAU-USP, 1992). Diretor da Studio Ilex Arquitetura e Paisagem Ltda. Professor Mestre da UNICEP; associado à ABAP e membro da diretoria do IAB – Departamento de São Carlos – SP.

(2) Luciana Bongiovanni Martins Schenk, arquiteta urbanista (FAU-USP, 1991), bacharel em filosofia (FFLCH-USP, 1997). Associada à ABAP. Professora Doutora responsável pela disciplina de Paisagismo do curso de Arquitetura e Urbanismo da Escola de Engenharia de São Carlos.

Participaram de diversos concursos nacionais e internacionais, recebendo 07 premiações de destaque.