por Luiz Fernando Janot (*)
O crescimento populacional e a valorização imobiliária nas cidades contemporâneas têm contribuído significativamente para a expansão urbana e a formação de núcleos habitacionais espalhados pelas periferias. Esse fenômeno se observa, inclusive, em algumas grandes cidades européias onde as regiões periféricas formam densos aglomerados urbanos. Do ponto de vista arquitetônico é visivelmente acentuado o contraste existente entre as edificações no núcleo central e nas periferias.
Se tomarmos como exemplo a cidade do Rio de Janeiro, esse contraste adquire maior proporção na medida em que entram em cena as favelas e os loteamentos irregulares. A maioria das habitações construídas nesses locais carece de requisitos mínimos de habitabilidade em decorrência da falta de recursos financeiros das camadas mais pobres da população. E o que dizer, então, da qualidade arquitetônica dessas moradias? Essa é uma questão relevante que precisa ser enfrentada com determinação. Um programa de melhorias habitacionais torna-se, neste momento, indispensável não apenas para elevar a qualidade de vida e a auto-estima dos moradores, mas, sobretudo, para propiciar um “upgrade” na ambiência local e na imagem da própria cidade.
Esse esforço comunitário e governamental para melhorar o padrão de qualidade das habitações não pode ficar restrito, unicamente, aos assentamentos populares. É necessário, também, que o empresariado da construção civil se empenhe na melhoria da qualidade das construções, evitando que elas interfiram negativamente na paisagem do Rio de Janeiro. Difícil não generalizar esse pensamento em relação aos empreendimentos imobiliários na Barra da Tijuca, onde consumidores e incorporadores se mostram mais preocupados com a segurança e o status social do que propriamente com a produção de uma arquitetura verdadeiramente de qualidade. Os condomínios residenciais e empresariais lá construidos, em sua grande maioria, são formados por edificações de gosto duvidoso identificadas com o “mainstream” internacional. A concepção formal desses edifícios, quase sempre, incorpora elementos cenográficos descartáveis que encontram no simulacro a sua mais perfeita tradução.
Poderíamos relacionar uma quantidade expressiva de edificações que se enquadram nessas condições. Entretanto, preferimos deixar para os leitores o exercício de identificá-las em seus trajetos cotidianos. Deve-se adotar como enfoque a arquitetura que sobressai às demais apenas pela sua extravagância e espetaculosidade. Para que se possa traçar um paralelo comparativo com prédios de expressivo valor arquitetônico, relacionamos alguns exemplos paradigmáticos de edifícios que marcaram a arquitetura carioca do início do século XX até a década de 80, quando essa fonte de referência, lamentavelmente, começou a ser desprezada.
São eles, os edifícios “Art Déco” nos bairros de Copacabana e Flamengo, destacando-se o Biarritz. Os prédios da Mesbla e do Hotel Serrador nas imediações do Passeio Público. Os edifícios-sede do Banco Boavista (hoje Bradesco) de Oscar Niemeyer e do Banco Aliança (hoje Itaú) de Lúcio Costa, ambos, na Praça Pio X. Os criativos edifícios residenciais projetados pelos irmãos Roberto no Parque Guinle, na Rua Farani e na Rua República do Peru. A sede da Fininvest na Rua da Passagem e o edifício empresarial Leonel Miranda na Rua do Ouvidor, projetados pelo arquiteto Paulo Casé. E, obviamente, o Palácio Capanema (antigo MEC), a ABI, o MAM, o Monumento dos Pracinhas, o Aeroporto Santos Dumont, a Maison de France, o Consulado Americano e o Conjunto Habitacional Pedregulho projetado por Reydi.
A verdade é que os interesses que envolvem atualmente a produção arquitetônica carioca diferem substancialmente daqueles que condicionaram os projetos citados. O modelo consumista, que vem condenando à obsolescência diversos prédios e bairros importantes do Rio, precisa ser revisto para evitar que a cidade continue sendo tratada como um bem descartável qualquer. Para reverter esse processo é imprescindível evitar a vulgarização da arquitetura que vem sobressaindo nos últimos anos.
Neste momento histórico em que se vislumbra a retomada do desenvolvimento econômico do Rio, não se pode mais submeter a cidade a certos modismos arquitetônicos caricatos que comprometem irremediavelmente a sua paisagem urbana e natural. Para se contrapor a essa tendência é necessário investir na formação acadêmica e profissional dos arquitetos e promover uma reflexão crítica sobre o amplo repertório arquitetônico e urbanístico divulgado no Brasil e no exterior. Somente a partir de uma base conceitual sólida é que poderemos convencer o empresariado e o poder público da necessidade de realizar concursos de projetos para se extrair, como resultado, uma arquitetura efetivamente de qualidade.
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Publicado originalmente no Jornal O Globo, em 19/02/2011. Agradecemos ao autor pela disponibilização do texto para publicação.
(*) Luiz Fernando Janot é Arquiteto e Urbanista,Professor da FAU-UFRJ.
Antes de mais, devo dar os meus parabéns pela dissertação. A abordagem dos problemas reais é muito esclarecedora, embora feita de um ponto de vista tendencialmente académico.
Surgem-me duas questões:
– Como integrar essa Melhoria Habitacional de que fala no ambiente social das favelas do RJ? Um projecto abrangente implica cadastrar os beneficiários que, no caso,, têm relações (voluntárias ou involuntárias) com assaltantes e traficantes de drogas. Trata-se de um problema com raízes sociais, também. Podemos, se calhar, admitir que os investidores imobiliários não se sentem seguros em aplicar o capital num mercado de regras pouco claras.
– O arquitecto deve agir como educador do seu cliente? Ou seja, nos novos bairros de luxo, de edificações espectaculosas, os arquitectos tiveram sua intervenção, com resultados que você chama “de gosto duvidoso”. Acreditando no seu parecer, temos que lembrar q o principal interesse da imobiliária está a ser o lucro. Arquitectos poem-se numa situação de produzir imagens apelativas, ainda que iludam o destinatário dobre o real benefício.
Seja qual for a resposta, a leitura q faço é a seguinte: gasta-se muitos recursos pra servir de forma duvidosa `ss classes com poder, e as classes sem poder continuam SEM SERVIÇO.
Obrigado
bravo,
espero que este clic, pique outros , e acordem, pra o que esta acontecendo
redescubram uma nova arquitetura
Desculpe, mas não acredito nesses tipos de argumento, que põe a arquitetura como uma ferramenta solucionadora de problemas sociais…
E muito menos definidora de estilos… Por tanto acho desnecessário descutir qualidade num mundo q roupas musicas carros cabelos peles, mudam a toda hora… Hoje o q exsite é uma diversidade cultural globalizada, nada mais justo q a arquitetura representar tudo isso… Agora sobre os problemas habitacionais, acredito numa soluão muito simples, melhoria de condição economica e social dos indivíduos que criam esses redutos… É seguir um lema antigo, ensine a pescar que o indiiduo vai conseguir matar sua fome pro resto da vida e não se verá obrigado a se sujeita a arquiteturas tão medíocres… Enfim, acredito que a solução de nossa e da profissão de muitos outros profissionais e da sociedade é criar instituições multidiciplinares que se instalem nesses guetos para melhorar sua condição de vida através da troca de conhecimentos… Obrigado