por Fabiano Sobreira,
editor do portal e revista concursosdeprojeto.org.

Olhar atento, profundidade analítica e qualidade do produto editorial (edições para se guardar, como livros), que seguem o caminho contrário da pressa, do descarte e da superficialidade que marcam o cotidiano contemporâneo, inclusive editorial. Essa é a nossa leitura da Revista Monolito, uma “revista monográfica de arquitetura”.

Apesar de definida pelos seus editores como uma revista cultural, e não técnica, pois “destina-se não só a arquitetos, mas a todos os leitores interessados no assunto”, tornou-se (na opinião desta editoria), em pouco tempo, uma das principais publicações periódicas de Arquitetura no atual cenário editorial brasileiro.  A revista se destaca não apenas pela qualidade gráfica, mas especialmente pelo olhar atento sobre cada “tema”, pelos ensaios fotográficos e pela qualidade dos textos, que são publicados também em inglês.

Com periodicidade bimestral, dedicou o primeiro número ao arquiteto Angelo Bucci e em seguida ao escritório Andrade Morettin (n.02), Biselli + Katchborian (n.03), Inhotim (n.04) e Marcio Kogan Studio MK27 (n.05/06).

Em 08 de dezembro de 2011, já como leitor ávido da recém-lançada revista, enviei aos editores (por meio do formulário de “contato”, na página da revista na Internet) a sugestão de que no futuro próximo o tema “concursos” fosse abordado pela revista. Uma semana depois recebi do editor, Fernando Serapião, a boa notícia de que o tema já fazia parte dos planos da revista e que, por coincidência, os dois números seguintes da Monolito abordariam (direta ou indiretamente) o tema:

“Nosso próximo número – que ficará pronto no final de janeiro – será sobre habitação social em São Paulo (um terço da edição será dedicada ao concurso Renova SP). Estamos também negociando para os próximos números a cobertura completa de um concurso fechado que ainda é mantido em sigilo.”

Já havíamos publicado aqui em concursosdeprojeto.org os projetos do Concurso Renova São Paulo, em agosto de 2011 e tínhamos curiosidade sobre qual seria a abordagem da Monolito a respeito desse concurso, que consideramos o mais importante realizado naquele ano (inclusive pela inovação, do envio em meio eletrônico – iniciativa que promovemos e apoiamos) e que prometia ser um dos mais importantes dos últimos tempos (naturalmente, a efetivação dessa importância dependerá dos desdobramentos do concurso, em especial a contratação dos projetos, a execução das obras e sua recepção pelas comunidades). A revista foi além do concurso e dos projetos de arquitetura e abordou de forma mais ampla a questão da habitação social em São Paulo, com entrevista à então secretária adjunta e superintendente de Habitação Popular da Secretaria Municipal de Habitação (Sehab), Elisabete França, e com bons textos, dentre os quais destacamos o artigo “Áreas Urbanas Críticas”, de Hector Vigliecca (um dos vencedores do concurso).

Mas eu estava ainda mais curioso para saber qual o concurso fechado que seria objeto de uma publicação especial da revista Monolito, e que era mantido em sigilo por seu editor.

Dias depois, em 20 de dezembro de 2011, fui surpreendido com a notícia de que o Instituto Moreira Salles havia anunciado o vencedor de um concurso fechado para a sua nova sede na Avenida Paulista (notícia que prontamente publicamos em concursosdeprojeto.org e que foi seguida da publicação dos projetos de alguns escritórios convidados). Naquele momento suspeitei de que aquele era o concurso mantido sob sigilo por Serapião, que foi um dos membros do júri. Minha suspeita foi confirmada com a publicação da excelente edição número 8 da Revista Monolito, dedicada inteiramente ao concurso.

Conforme já se podia prever, pela proposta editorial da revista, a publicação foi além dos projetos de arquitetura do concurso (Andrade Morettin; Angelo Bucci; Arquitetos Associados; Bernardes + Jacobsen; Marcio Kogan e Una Arquitetos) e trouxe outros olhares sobre a iniciativa e a história do Instituto Moreira Salles: artigo de Guilherme Wisnik e ensaio fotográfico de Marcel Gautherot, ambos sobre a Casa da Gávea, sede do IMS no Rio de Janeiro; ensaio fotográfico de Leonardo Finotti sobre a Sede do IMS em Poços de Caldas, Minas Gerais e entrevista com os autores do projeto vencedor (Vincícius Andrade e Marcelo Morettin).

Mas o destaque da edição, em nossa perspectiva, é o texto intitulado “As caixas”, escrito por Fernando Serapião, que descreve – de forma peculiar – os bastidores do concurso, ao mesmo tempo como ator e observador do processo, sob uma ótica privilegiada, enquanto membro do júri, enriquecida pelo olhar jornalítico do editor. O texto, ao relatar as apresentações dos candidatos e o julgamento dos trabalhos, é intercalado por passagens que falam do processo que levou à decisão pelo concurso, descrito pelo editor como uma “prudente maturação”. A opção por um concurso nacional (e não pela contratação de algum “protagonista da arquitetura mundial”) é assim desvendada por Serapião: “o argumento decisivo foi que não faria sentido um concurso internacional se o propósito do IMS é apoiar a cultura brasileira”. A instituição privada, que não tinha obrigações legais para a realização de um concurso, simplesmente optou pelo procedimento que lhe parecia mais apropriado, para alcançar a qualidade esperada para a sua nova sede.

Enfim, edições para se guardar. Boa leitura a todos.